No escurinho do cinema

Queridão e eu costumamos ter um certo azar quando vamos ao cinema. É como se nos assentos ao nosso redor houvesse luminosos piscantes dizendo: "Se você é uma mala sem alça, sente aqui."´Parece praga, mas sempre nos sentamos perto de gente que fala alto, mastiga de boca aberta, ou atrás de gente cabeçuda ou muito alta. Considerei até adotar a estratégia Grace (de "Will and Grace", alguém lembra?) de colar chiclete a cadeira da frente para espantar os cabeções. Certa vez, durante uma sessão de "Vicky Cristina Barcelona", duas tias riam histericamente a cada cinco segundos atrás da gente. Devem ter lido na vejinha que o Woody Allen é um mestre da comédia e decidiram que deveriam achar graça em TUDO e rir bem alto para o cinema inteiro perceber que elas entendiam as piadas.
Sábado, sessão das nove de um filme alemão em um cinema de shopping, o que significa sala vazia. Como sempre faço nesses casos, acomodei minha bolsa e meu cachecol na cadeira ao meu lado. Repito: a sala estava vazia.
Mas lá estavam os luminosos piscantes bem no assento em questão. Diante de dezenas de lugares disponíveis (em fileiras até melhores que aquela), um velho resolve se acomodar com sua mulher bem naquele onde estavam meus pertences. Retiro os objetos, peço para Queridão colocá-los no assento ao lado dele e faço uma cara feia para o velho. Ele faz, claro, o "nem-te-vi."
O filme começa. Na primeira cena vemos um homem de cerca de 40 anos com uma mochila entrando em uma escola. O velho automaticamente vira para a mulher e diz: "Olha, é o professor."
Ai meu deos, um chato explicador. Jura que ele é professor, meu filho? É um filme de escola. Tem a foto do professor no pôster. Precisa explicar mesmo para a coitada da mulher? Não me aguento e olho feio pra ele mais uma vez. O filme segue. O tal professor encontra um colega no bebedouro e ao fim do diálogo o colega diz: "Alea jacta est." Claro que o velho não ia perder a oportunidade de esclarecer para sua pobre e burra esposa. Ri, satisfeito e diz: "A sorte está lançada." Olho feio pra ele pela terceira vez. Imagina se o cidadão resolve explicar o filme inteiro. Fiquei em pânico, confesso. Quero morrer com gente conversando no cinema. Pior ainda se for ao meu lado. Pior ainda se a pessoa ficar explicando o filme como se seu acompanhante fosse retardado.
Eu estava com sorte naquela noite, pois o velho deve ter, finalmente, entendido minha cara feia. Não deu um pio o resto do filme. Se bem que a família palmeirense atrás de Queridão parece ter discutido o jogo que tinha encerrado há pouco durante as duas horas. Não adianta. É nossa sina.

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