Sobre o Belas Artes

Tenho duas lembranças que se confundem sobre minha primeira ida ao cinema. Não tenho certeza se foi para assistir E.T. ou Mônica - A Princesa e o Robô. Procurei as datas de lançamento dos dois e são muito próximas, teria que perguntar à minha mãe, mas duvido que ela lembre.
Eu tinha quatro ou cinco anos. Se pararmos para pensar, é incrível que eu tenha recordações disso, mas me lembro quase que perfeitamente da sensação da sala escura, de ter chorado com o E.T. (de medo, hehe), de ter desejado um robô-coelho como o do desenho da Mônica.
A primeira sala de cinema na qual entrei deve ter sido o cine Jóia, na avenida Domingos de Morais, ou um na Praça da Árvore do qual não lembro o nome. Década de 80, ainda existiam cinemas de bairro. Cresci assistindo aos filmes da Xuxa e dos Trapalhões (nada de Dreamworks, moçada, pensa que era fácil ser criança mais de 20 anos atrás?) nestas salas.
Um pouco mais velha, com a permissão de pegar ônibus sozinha, comecei a frequentar o cine Gazeta (hoje o afrescalhado Reserva Cultural) ou as salas do shopping Ibirapuera - na época o mais próximo de casa. Só quase adulta atravessei a Paulista e conheci o Espaço Unibanco e o HSBC (na época só Belas Artes). O primeiro filme que assisti no Espaço Unibanco foi Dançando no Escuro. No Belas Artes não lembro.
Não é frescura nem coisa de gente pseudo-cult. Cinema pra mim é uma coisa séria. Não troco duas horas no escuro por Full HD 97 polegadas nenhum. E também acho cinema uma experiência pessoal, quase solitária, um bom filme é algo que a gente degusta sozinho ou no máximo com mais um muito bom amigo. Acho perigosíssimo encarar cinema num primeiro encontro - corre-se o risco sério de uma desilusão cinematográfica.
Aconteceu comigo. Levei um pretendente para assistir Encontros e Desencontros, filme que figura no meu top 10 fácil. Ao acender das luzes, o bonito vira-se para mim e diz: "Que fique claro que foi você quem escolheu esta bosta."  Fim de um relacionamento que nem tinha começado. Mas olha só, estou me desviando.
Fiquei sabendo que o Belas Artes vai fechar. Impossível listar todos os filmes que vi ali nos últimos 13 anos, que dividi com alguém ou comigo mesma. O último foi o citado aqui Abutres. Não fico triste pelas minhas lembranças - elas existirão independente de ali haver um cinema ou um Magazine Luiza. Fico triste pelos que virão, e que a cada dia ficam mais restritos aos Cinemarks da vida, gigantes lotados, sem história, sem calor humano. Fábricas de pipoca cara, casa de gente barulhenta e que não entende o quão sagrado é aquele escurinho para algumas pessoas.

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