Paulistanos

Ser paulistano é ter uma paciência infinita, quase abnegada. É ter uma certeza vinda não sei de onde de que essa cidade suja, violenta, bagunçada e de clima estranho é, no fundo, beeeeem lá no fundo, o melhor lugar do mundo pra se viver. Ser paulistano é achar graça em coisas que não tem a menor.

Por exemplo, um vez tentaram roubar meu celular dentro do ônibus. Claro, isso pode acontecer em qualquer lugar. Mas entendam, o moleque que tentou fazer isso estava pendurado do lado de fora do coletivo e esticou a mão pela janela para puxar meu aparelho enquanto eu lia uma mensagem. Eu dei um grito, o rapaz ao meu lado deu um safanão no braço misterioso e eu salvei meu telefone. Não, ISSO não deve acontecer em qualquer lugar. E enquanto eu escrevo isso, acreditem, rio por dentro porque olha, trombadinha pendurado do lado de fora de ônibus para assaltar só nessa terra mesmo.

Sábado passado aconteceu de novo. Fomos jantar na casa do meu tio, lá em algum lugar na zona Sul, região que, pra mim, é um mistério completo. Minha mãe deixou o carro na rua, em frente ao prédio. Ela tem uma Montana. Enfim, jantamos, tomamos cerveja, revimos a parentada e na hora de ir embora, descobrimos que a caminhonete continuava no mesmo lugar, mas a porta da caçamba àquela hora já tinha virado maconha na favelinha que fica algumas ruas para baixo. Sim, coleguinhas, roubaram a porta da caçamba da Montana. Conheço gente que já teve o som do carro roubado, pneus, estepe. Mas porta, só aqui nessa cidade, não é possível.

Hoje minha mãe iniciou as buscas por uma porta nova e descobriu, para seu desgosto, que uma na concessionária vai custar quase três mil reais, já que ela é vendida crua, sem pintura por dois mil. Começou a telefonar para as lojas de peças usadas (vulgo desmanches) e descobriu que, olha a coincidência, há uma porta de caçamba de Montana 2010 prata novinha em um lugar lá na Ricardo Jafet. Sim, minha mãe tem uma Montana 2010 prata. Sim, a Ricardo Jafet fica a uns três quarteirões da favelinha perto da casa do meu tio.

Neste exato momento minha mãe está se dirigindo até a zona Sul para comprar por mil reais a porta da sua própria caminhonete. Paulistano é mesmo um povo teimoso. Ou burro, vai saber.

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